
Na desmesurada sabedoria da minha juventude… eu não hesitaria em dizer quem é o “homem”… “ser humano”. Actualmente… depois de inúmeras reflexões e estudos e das mais variadas vivências… com muita humildade… tenho de resignar-me a dizer que não sei.
Eu não sei quem é o homem! Eu conheço e vivo Jesus Cristo mas não consigo compreender quem é Deus! Eu não conheço o Mundo!… E quanto mais tento aprofundar as minhas experiências e saberes… mais oportunidades encontro de testar a minha incomensurável ignorância.
Mas não sou única!... Há dias, encontrei a minha amiga Vanda que não via faz tempo. Depois de serenados os ânimos das manifestações alegres e entusiastas do encontro, resolvemos tomar um saboroso e tranquilizante chazinho para pormos a conversa em dia. E não sei como, talvez por termos gostos idênticos, demos connosco a falar sobre a melhor forma de viver a espiritualidade.
Neste contexto, dizia-me ela:
-“Eu cada vez percebo menos de tudo quanto vejo… o desconhecimento de Deus, da vida e das coisas, cada vez é maior. Mas também isso de pouco me interessa. Na minha forma de ser e estar, vou ultrapassando esta intempérie apostando viver lado a lado com o mistério… ou melhor dizendo… integrada no mistério… porque eu… embora infimíssima… também sou uma célula da humanidade.”
Depois da minha convicta concordância, continuou:
-“Pensar que ‘o mais importante é invisível aos olhos’ faz parte do meu dia a dia, em todos os seus momentos, e dá-me a oportunidade de, pelo menos, tentar olhar as pessoas que me rodeiam de forma amorosa e compreensiva, porque consigo vê-las com os olhos do meu coração ou sentimento.
No desenrolar da vida, há muitas situações em que não consigo fazer o que quero, e em vez de andar com a alegria e boa disposição desejada, sem saber como nem porquê, acabo por ser acometida por crises de insatisfação e mau humor que não consigo conter. E são estes meus comportamentos esquisitos de falta de auto-conhecimento e auto-controle que me levam a conviver melhor com as pessoas, mesmo sem as conhecer inteiramente, até porque já me convenci que não é possível… não posso ter a pretensão de conhecer os outros se não sou capaz de me conhecer a mim?
Depois… o ter de me desculpar das asneiras que vou fazendo… também me dá uma maior capacidade de desculpar os deslizes das pessoas com quem convivo. O reconhecimento e aceitação das minhas debilidades e fraquezas ajuda-me a compreender e aceitar as debilidades e fraquezas dos outros. É lógico!”
A importância do tema fez-me perder a noção de tempo… e tanta abertura… convidou-me a fazer silêncio… enquanto a explicação continuou:
-“As convicções religiosas têm que ser respeitadas. Cada um é como é! O caminho para chegar a Deus é diferente de pessoa para pessoa. E temos de respeitar o ritmo de cada um… ritmo que só Deus conhece. Quem se esforça por amar, aceitar e compreender… consciente ou inconscientemente, está com Deus que sempre será um mistério tão incompreensível quanto o homem! Eu… não consigo saber verdadeiramente quem é Deus… mas também não consigo viver sem ELE, porque ELE é parte integrante de mim e só o viver com ELE e para ELE me satisfaz.”
Olhamos o relógio… apreensivas… e… antes do beijo apressado de despedida, prometemo-nos, mutuamente, continuar a conversa… num outro qualquer dia!
Hermínia Nadais
herminia.nadais@sapo.pt
A publicar no "Notícias de Cambra