
"Palavras, leva-as o vento"!... Elas só têm valor quando ligadas a actos conscientes e responsáveis que ponham em evidência, nas realidades da vida, as afirmações e convicções de quem as pronuncia.
"Trabalhar para a construção de um mundo melhor" é frase corrente na linguagem de todos os cidadãos.
Falar é fácil!... Fazer da própria vida um meio de construir esse "mundo melhor" é difícil, delicado e controverso. Mas é o mais importante, urgente e necessário, não só para a integração social e realização pessoal de cada um, mas também, e mais ainda, para o desenvolvimento comunitário, para a paz e unidade entre os povos, as nações, o próprio Mundo. Discernindo o mais conveniente, caso a caso, entre o apelo à emoção ou à razão, cada um, em espírito e verdade, deve tentar descobrir a forma de conjugar estas duas forças em todas as situações ao longo da sua existência, de forma a obter cada vez maior respeito por si e pelo seu semelhante.
Ninguém pode dar o que não tem; ninguém pode desejar o que não conhece; ninguém pode usufruir do que para ele não existe...
Estas frases, assim soltas, parecem desprovidas de sentido; no entanto, estão directamente relacionadas com muitas realidades.
Os comportamentos sociais de qualquer comunidade são transmitidos de pais para filhos, de avôs para netos; assim sendo, passam a fazer parte integrante dos costumes e tradições dessa comunidade e de cada um dos seus membros.
Nos nossos dias, existem as comunidades mais díspares, algumas delas com costumes bem bizarros. É só prestar atenção a tantos documentários televisivos... E quanto mais primárias, mais difíceis de compreender e mais tenazes na defesa ou ataque. E todas lutam por valores que pensam ser os melhores.
Isto verifica-se desde os membros dos clãs às inúmeras religiões ou crenças, partidos políticos ou associações...
O reconhecimento do valor do ser humano em toda a sua plenitude e com todos os seus dons: carinho, amor, tolerância, compreensão... é apanágio dos seres mais cultos. Poderemos dizer que "cada povo tem a sua cultura", e é uma verdade; mas os valores atrás referidos não são pertença de uma cultura, são universais, devem caber "todos" em "todas" as culturas.
Mas, como podem ser transmitidos se não existem totalmente numa comunidade? Ninguém pode dar o que não tem.
E como pode uma comunidade querer melhorar os seus hábitos, se não sabe como é melhor, se não conhece outra forma de vida além da sua? Ninguém pode desejar o que não conhece.
Se as pessoas vivem em comunidade, e se essa comunidade é limitada nos seus costumes e tradições, como podem ter algo de melhor? Ninguém pode usufruir do que não está ao seu alcance, quando muito, apenas pode lutar por consegui-lo.
Podem parecer absurdas estas afirmações. Mas, se pudermos imaginar-nos nascidos, por exemplo, no meio da amazónia, como seriam as nossas atitudes? De índios, com certeza...
E aqui, dentro da comunidade portuguesa, com toda a riqueza da sua cultura... como seria o comportamento de um professor, o meu caso por exemplo se, ao invés de ter nascido dos pais que tive, viesse ao mundo numa comunidade cigana com todos os problemas que isso implica?
Quanto mais condições sócio-económicas, conhecimentos e capacidades tiverem as pessoas, mais responsabilidades têm na construção de um mundo melhor. Os bens usufruídos devem fazê-las mais compreensivas, carinhosas, pacientes e caritativas para com todos os outros a quem a sorte não concedeu tantas benesses. Usando as palavras, sim, mas não só... pois é preciso lutar contra as nossas más tendências e praticar boas acções.
Hermínia Nadais
Publicada no Notícias de Cambra